terça-feira, 30 de novembro de 2021

Karl Popper, darwinismo, instrução e seleção natural

Na fase mais tardia do pensamento do filósofo, lógico e epistemólogo austríaco Karl Popper, o conhecimento é visto segundo uma abordagem darwiniana. O filósofo identifica três níveis de atividade adaptativa nos seres vivos - genética, comportamental e científica – que operam fundamentalmente pelo mesmo processo, a saber, Instrução e Seleção. 

Os seres vivos trazem já neles mesmos uma estrutura amplamente herdada de seus ancestrais que se manifesta em sua herança genética, sua fisiologia, seu comportamento, suas expectativas e suas ideias, o que Popper identifica como Instrução. Esta herança é exposta às pressões do ambiente (Seleção), onde os conteúdos menos adaptados são extintos. Diante do problema da Seleção, o organismo realiza modificações internas em sua Instrução para fazer frente às exigências ambientais externas. 

No caso dos seres não dotados de linguagem, tal modificação fica a cargo das mutações genéticas aleatórias e das mudanças comportamentais razoavelmente também aleatórias. No homem, tal processo chega ao seu nível mais alto, pois, através das funções descritiva e argumentativa da linguagem, há um direcionamento racional da modificação interna, agora precipuamente em termos de expectativas hipotéticas linguisticamente formuladas na forma de teorias científicas. Os seres humanos testam suas teorias e as mudam quando necessário. As teorias morrem no lugar de seus proponentes.

Ao contrário das epistemologias tradicionais, chamadas de pré-darwinianas por Popper, o ser vivo não recebe passiva e indutivamente do ambiente as informações para daí erigir reações adaptativas ou expectativas e teorias no caso humano. Os seres vivos trazem já em si a Instrução que é submetida à Seleção do ambiente. Modificações nessa Instrução acontecem e podem ser encaradas como tentativas de solução dos problemas enfrentados.

Soluções essas que são aleatórias no caso da genética e do comportamento, e que são racionalmente orientadas como hipóteses e teorias no caso humano. O essencial aqui é o método de tentativa e eliminação dos erros que percorre os três níveis. Tal perspectiva darwiniana esposada por Popper é uma nova tentativa de refutação das epistemologias indutivistas. 

O forte acento na anterioridade da instrução frente ao ambiente contrasta com a tradicional visão do conhecimento onde o ser vivo aprende indutivamente as características e uniformidades do mundo. E assim como a seleção natural darwiniana pode “simular” os passos adaptativos do lamarckismo, também o método de Instrução e Seleção pode “simular” os passos indutivos.

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