segunda-feira, 18 de abril de 2011

Notas curtas sobre o simbolismo da entrada de Jesus em Jerusalém




Jesus entra em Jerusalém montado num jumentinho e aclamado como rei pela multidão que acena-lhe com palmas e ramos dizendo: "Hosana ao Filho de David. Bendito o que vem em nome do Senhor."

Nessas curtas frases de júbilo são afirmadas a autoridade espiritual e o poder temporal harmoniosamente reunidos na figura de Jesus. Ele é filho de David, ou seja, da casa real de Israel, usurpada pelo rei estrangeiro Herodes Antipas, fantoche patrocinado pelos romanos.

Jesus "vem em nome do Senhor", ou seja, quem O envia é o próprio Deus de Abraão, Isaac e Jacó. Paulo, em suas epístolas, afirma categoricamente que Cristo é o Sumo Sacerdote legítimo e completo que realiza o sacrifício da nova e Eterna Aliança. É sacerdote "segundo a ordem de Melchisedec", o misterioso rei-sacerdote de Salem (paz), no Gênesis, que traz consigo o pão e o vinho.

Jesus é o rei-sacerdote que entra na cidade de Jerusalém aclamado e reconhecido pelo povo e, por algumas horas, até sua detenção tramada por Caifás e pelo Sinédrio corrupto, Ele é legitimamente o rei. Mas Seu reino "não é deste mundo" e Jesus, após ser aclamado, retira-se dali.

Humildemente, sobre um jumentinho que ainda não havia sustentado carga, Jesus adentra Jerusalém simbolizando a simplicidade na qual os eventos divinos se dão. O microcósmico encontra o macrocósmico, o que está embaixo se encontra com o que está em cima. O Logos se assenta sobre um animal de carga.

O Verbo entra em Jerusalém, simbolicamente o centro do mundo e inaugura Seu reino. Jerusalém era governada por um poder temporal ilegítimo e por uma autoridade espiritual destituída de suas prerrogativas. Caifás é o símbolo da autoridade espiritual que já não reconhece a Verdade, que apega-se aos ritos exteriores e aos apelos do mundo, e que escandaliza-se diante da manifestação livre e sublime do divino.

Ao centro do mundo retorna o Logos, o criador, o alfa e o ômega de tudo o que há. O simbolismo é claro: restaura-se o equilíbrio perdido. E a "iniciativa" é sempre divina, jamais humana. Os vínculos sagrados estão restabelecidos.

O reino de Israel cumpre nesse dia seu fim no plano terrestre: o Messias se torna rei na sua capital, Jerusalém, e inaugura um reino que ultrapassa os sentidos. O centro do mundo está agora dentro do coração dos homens. "O Reino dos Céus está dentro de vós".

domingo, 3 de abril de 2011

Stanley Jaki e as origens da ciência


"A originalidade européia, a qual se evidencia muito palpavelmente na ciência, tem sua origem no Evangelho, cuja pregação plantou fundo nas mentes européias, muito antes de Bacon e Descartes, a convicção de que o universo era o produto racional do Criador e de que, como cristãos, eles tinham se tornado mestres e donos da natureza. O novo Organon da ciência não estava no extenso tatear de Bacon sobre fatos na maior parte das vezes irrelevantes, mas na convicção partilhada bem antes dele de que, uma vez que o mundo era racional, ele poderia ser compreendido pela mente humana, embora, como produto de um Criador, ele não podesse ser derivado da mente do homem, uma criatura. É óbvio que as sementes do Evangelho, ou mais concretamente do credo cristão, o qual afirma ao mesmo tempo a Antiga e a Nova Aliança, precisaram de uma matriz natural, social e psicológica para germinar em palpáveis originalidade e gênio sobre a natureza." (tradução minha do original em inglês)

STANLEY JAKI, The Origin of Science and the Science of its Origin, p.21


Onde se encontra na história a origem da ciência? Na Grécia antiga ou na pregação baconiana do século XVII? O historiador e filósofo da ciência, físico, matemático, professor de Física na Seton Hall University, teólogo e monge beneditino húngaro Stanley Jaki diria que nenhuma das duas respostas possíveis dessa disjunção é correta.

Avesso a certas historiografias da ciência que tentam remontar as origens da ciência às elucubrações geométricas de Arquimedes ou buscam explicar o fenômeno científico do século XVII através da postulação de uma transformação mental e conceitual súbita, misteriosa e sem precedentes, Jaki defende a tese de que essas origens devem ser encontradas na Idade Média, em estreita conexão com os pressupostos mais característicos do cristianismo.

Segundo Jaki, é na pressuposição de que o homem é uma criatura racional habitando um universo criado livremente por um Deus igualmente racional que a ciência pôde dar seus primeiros passos ainda na Idade Média e não, por exemplo, na Grécia antiga.

Se houve progressos na geometria e na matemática gregas - principalmente com Arquimedes - eles foram obnubilados pelas metafísicas restritivas de Platão e Aristóteles que vetavam, com maior ou menor ênfase em cada caso, a aplicação da matemática ao mundo natural.

Ao contrário dos gregos, o cristão medieval sabia que o mundo era um artefato racional e consistente criado por um Deus que dispôs todas as coisas "em medida, número e peso", como asseveram as Escrituras (Sabedoria 11, 21).

O que Platão nunca sonhou em fazer, uma ciência física baseada na geometria e na matemática, o cristão poderia realizar sem medo de erro. E, de fato, Galileu, um cristão devoto, o realizou sobejamente. Nesse sentido, defende Jaki, Galileu estava seguindo seus mestres medievais.

Contudo, o gênio italiano se afasta deles na sua cegueira em não compreender os limites intrínsecos do método quantitativo, tomando o homem como imagem de quantidades e não de Deus.

Jaki, apoiando-se e inspirando-se na obra historiográfica de Pierre Duhem, combateu durante sua longa e prolífica vida acadêmica as principais correntes interpretativas da história da ciência que relegam o cristianismo ao papel de inibidor do nascimento e do progresso da ciência.

Com Duhem, Jaki defendia que foi no fim da Idade Média, nos trabalhos dos parisienses Jean Buridan e Nicolas Oresme, que se formularam pela primeira vez as idéias fundamentais do que seria posteriormente conhecido como o princípio da inércia.

Tal formulação foi possível graças à inovadora doutrina cristã da criação livre do mundo que rompeu com a idéia grega da eternidade do cosmos. Foi através dessa doutrina que os medievais puderam conceber a idéia de um movimento celeste perpétuo impulsionado de uma vez por todas por Deus no início dos tempos.

Para Duhem e Jaki, essa formulação, embora ainda limitada ao mundo supralunar, inaugura a ciência moderna na medida em que rompe decididamente com as amarras da física aristotélica e permite o posterior desenvolvimento e postulação definitiva, já no século XVII, do princípio da inércia.

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Biografia intelectual de Stanley Jaki