domingo, 30 de dezembro de 2007

SPE SALVI

"Se, diante do sofrimento deste mundo, o protesto contra Deus é compreensível, a pretensão de a humanidade poder e dever fazer aquilo que nenhum Deus faz nem é capaz de fazer é presunçosa e intrinsecamente não verdadeira. Não é por acaso que dessa premissa tenham resultado as maiores crueldades e violações da justiça".

BENTO XVI

segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

O Paraíso com os meios da Queda

Em http://oleniski.blogspot.com/2007/10/tenso-religiosa.html e http://oleniski.blogspot.com/2007/10/tenso-religiosa-ii.html tratei da tensão essencial que está no âmago da religiosidade, a tensão entre o caráter atemporal do mundo divino e o caráter temporal do mundo humano.

A religiosidade surge do fato de que nossa existência temporal somente tem sentido e importância a partir de uma dimensão transcendente e atemporal que ultrapassa qualquer consciência individual. Assim, este mundo é uma parte ínfima de uma verdade ainda a ser descortinada.

A teologia ortodoxa afirma (contra o amartiocentrismo de Tomás de Aquino) que a Encarnação do Verbo, o nascimento do Messias, é a realização da divinização da natureza por iniciativa exclusiva de Deus. Ou seja, Deus se torna homem, encarna-se, torna-se temporal, para que a criação temporal seja tornada divina. O mundo divino absorve o mundo dos homens. Realiza-se a junção entre o transcendente e o imanente.

A tensão religiosa é resolvida então por Deus e em Deus. Não é o homem que constrói uma ponte entre essas dimensões, mas é Deus que toma a iniciativa. É graça e não trabalho humano. Como dizia São João da Cruz, "se é verdade que o homem procura Deus, é mais verdade ainda que Deus procura o homem."

A civilização ocidental, pós-Idade Média até nossos dias, se caracteriza pelo processo inverso. Dostoievski, Nietzsche, Cioran, Voegelin entre outros (com semelhanças e diferenças) perceberam que o caminho ocidental marcava-se pela tentativa de fazer coincidir a cidade dos homens com a cidade de Deus, fazer o imanente, o temporal engolir o atemporal e o transcendente.

Ou seja, o ocidente tentou realizar o paraíso aqui mesmo na Terra com os meios terrestres. Seja a idéia do progresso científico-tecnológico do iluminismo e de seus filhos cientificistas, seja as idéias de sociedades pacíficas, igualitárias e utópicas do anarquismo, seja a sociedade sem classes do socialismo-comunismo ou a raça ariana nazista, todas querem fazer o paraíso à força. Contem-se os corpos...

A unidade e a felicidade trazidas ao mundo por meio da força e do engenho humano, eis o que se tentou realizar. Entretanto, os valores transcendem os indivíduos e estes só o podem encarná-los limitadamente.Tentar fazer com que os indivíduos os encarnem perfeitamente, por força humana somente, é não compreender suas naturezas (a dos homens e a dos valores).

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Criative Elements in Science



"There is a creative element in every reasoning: this is most strongly manifested in explanation. [...] The generalization 'every S is P' may be interpreted either as a set of singular descriptions or as the relationship 'if something is S, then it is P'. If a generalization is a set of singular judgements, it covers not only those cases which have been investigated, but unknown cases as well. By assuming that the unknown cases behave like the known ones, we do not reproduce facts that are empirically given, but we create new judgements on the model of judgements about known cases.

If a generalization expresses a relationship, it introduces a factor that is alien to experience. Since Hume's time we have been permitted to say only that we perceive a coincidence or a sequence of events, but not a relationships between them. Thus a judgement about relationship does non reproduce facts that are empirically given, but again is a manifestation of man's creative thought"

"[...] which scientific judgements are pure reproductions of facts? For if generalizations, laws, and hypotheses, and hence all the theories of the empirical sciences and the entire sphere of the a priori sciences are the result of the creative work of the human mind, then there are probably few judgements in science that are purely reproductive.

The answer to this question appears to be easy. Only a singular statement about a fact which is directly given in experience can be a purely reproductive judgement, for instance: 'a pine grows here', 'this magnetic needle now deviates (from its previous position)', 'in this room there are two chairs'. But whoever investigates these judgements more closely will perhaps find creative elements even in them. The words 'pine', 'magnetic needle', and 'two' stand for concepts, and hence concealed labour of spirit through them. All the facts formulated in words are, primitively it may be, interpreted by me. A 'crude fact', untouched by the human mind, seems to be a limiting concept."

JAN LUKASIEWICZ

sábado, 8 de dezembro de 2007

Outros pensamentos sobre a História Sem Fim

"Há pessoas que não podem ir a Fantasia , disse o Sr. Koreander, e há pessoas que podem, mas ficam lá para sempre. Porém, há outros que vão a Fantasia e regressam. Como você, Bastian. E são esses que devolvem a saúde aos dois mundos."


É muito fácil perder-se no torvelhinho dos desejos que Fantasia realiza. Mais fácil ainda é perder-se em ilusões de poder absoluto. Muitos se perderam justamente aí. Ao tornarem-se ditadores, perderam a lembrança de sua vida humana. Como poderiam tornar-se ilimitadamente poderosos em Fantasia sem perder sua condição de homens, sua inerente limitação humana? Tornar-se outro totalmente não implica o abandono do passado que será esquecido como se não houvesse existido?

Na Cidade dos Imperadores Esquecidos, Bastian está a um passo de perder-se definitivamente. Moveu guerra contra os seres de Fantasia que não se submeteram às suas vontades (nem tudo em Fantasia está sob nosso comando) e agora, sozinho vê-se numa cidade cujos habitantes nada mais são do que zumbis estúpidos que não mais podem desejar depois de desejarem ser os reis e senhores de Fantasia. Quiseram identificar-se com a alma de Fantasia, a Imperatriz Criança.

Ao fazerem isso, enlouqueceram. Esqueceram suas vidas anteriores, e com isso, perderam sua própria natureza humana. A via de auto-conhecimento que o AURIN indica em sua inscrição se tornou para eles motivo de destruição. Os desejos são traiçoeiros, nos levam a direções diversas. Há que saber usá-los para a Grande Busca.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Em Fantasia..

Continuação do post anterior...

Os homens projetam em Fantasia seus anseios, desejos, carências, fomes, medos e sonhos. Se ela pode se tornar um caminho de conhecimento, também pode se tornar uma via de ensimesmamento e egoísmo. Bastian é assaltado por desejos de fazer o bem para os seres de Fantasia dando-lhes histórias, sentido. Mas também se sente inclinado ao desejo de reconhecimento e gratidão, de reverência e submissão.

Ser bom, mas ser conhecido e reverenciado por isso. Ser sábio, a ponto de humilhar os mais sábios e inteligentes, mas ser famoso por isso. Ser notório em Fantasia, uma vez que não o era no mundo dos homens.

Não é difícil perder-se em seus próprios desejos, já o advertia Graograman. Não será bom ter servos feitos de lata e ocos por dentro, que nada fazem além da vontade de seu mestre, como a feiticeira Xaíyde? Será que Bastian é como certos homens que só freqüentam Fantasia para se deleitarem com imagens de poder e controle absolutos? É ele assim tão comum? O Salvador de Fantasia vai estragar tudo desejando somente imperar egoisticamente?

E note que à medida em que Bastian se sente mais inclinado a tais desejos, mais ele se esquece da sua vida na terra dos homens, seu mundo-natal. Embrenhar-se em Fantasia tem seus riscos. Pode-se desejar nunca mais voltar. Há o risco de se perder duplamente. Perder-se no caminho de seus desejos e daí perder-se de si mesmo, cair presa de sonhos megalômanos.

Ao que parece, não é o suficiente salvar Fantasia, não deixar que seus habitantes, uma vez engolidos pelo Nada, se tornem ilusões e mentiras no mundo dos homens. É preciso saber estar em Fantasia.

Pensamentos sobre A História Sem Fim



Após dar um novo nome à Imperatriz-criança, salvando assim Fantasia do perigo de ser engolida pelo Nada, Bastian entra, ele mesmo, na História Sem Fim. Ele agora não é mais um leitor, mas ele vive em Fantasia. Assim, o novo nome, a nova função de Fantasia na vida dos homens é dado primeiro por uma decisão individual. É Bastian quem decide primeiro, em sua vida, o destino de Fantasia. Se ao menos um filho dos homens o fizer, então a ameaça pode ser afastada.

Uma vez feito isso, ele é admitido no mundo da História Sem Fim. Ele se encontra em Fantasia, mas mudado, segundo seu desejo de não ser mais um fracote gordo e desengonçado. Ele agora é forte e bonito. Em suma, ele é outro. Quem entra em Fantasia não permanece o mesmo. Molda-se segundo seus desejos. Aliás, Fantasia também se molda segundo seus desejos. Bastian sente então a alegria da criação livre, o desatar da imaginação.

Recebe de Graograman o AURIN (o símbolo de regência de Fantasia pertencente à Imperatriz criança) que lhe dá plenos poderes e que tem atrás a inscrição: "FAZE O QUE DESEJARES". Mas isto não significa que Bastian pode fazer arbitrariamente o que quiser. Ele deve percorrer a perigosa via de seus desejos em busca de sua Verdadeira Vontade. Então, a inscrição indica um meio para o auto-conhecimento. Para a descoberta do que somos de verdade, de qual é nosso mais verdadeiro desejo, e, por conseguinte, nosso maior valor.

Fantasia pode se tornar uma via de conhecimento de nosso eu mais profundo se, no turbilhão de nossos desejos, nos dedicamos a descoberta daquilo que realmente desejamos, aquilo que viemos buscar em Fantasia, aquilo de que é carente o mundo dos homens. E só se descobre isso desejando, até que nossa Verdadeira Vontade apareça, livre do peso esmagador da desordem dos desejos passageiros ou de valor inferior.

E essa parece ser a questão: valor. O que há em ti de mais importante, o ápice da pirâmide de teus valores? Acho que é essa a pergunta. E Fantasia, pode ser um caminho para isso. Deter-nos em Fantasia revela nossos desejos e nossos valores porque nela só buscamos o que, de algum modo, nossa alma anseia . E ao identificar em Fantasia o que ansiamos e, principalmente, o que ansiamos acima de tudo, descobrimos o nos vai na alma no seu mais profundo. É um socrático "conhece-te a ti mesmo" nos domínios de Fantasia.

...

Continua em:



domingo, 2 de dezembro de 2007



Essa foto me lembrou o stariéts Zózima d`Os Irmãos Karamazov de Dostoievski.