quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Alvin Plantinga, conhecimento e o argumento contra o naturalismo




"Em mim sempre nasce a horrível dúvida se as convicções da mente humana, a qual desenvolveu-se a partir da mente dos animais inferiores, têm qualquer valor ou são confiáveis. Confiaria alguém nas convicções da mente de um macaco, se houvesse alguma naquela mente?" CHARLES DARWIN *

O prestigiado filósofo analítico americano Alvin Plantinga (hoje aposentado) lecionou e trabalhou durante anos nas áreas da epistemologia, metafísica, lógica, filosofia da religião e filosofia da ciência. Ele foi um dos expoentes da chamada "epistemologia reformada", movimento de inspiração calvinista nos EUA, e deu contribuições originais à discussão epistemológica contemporânea. 

Plantinga ficou conhecido no mundo acadêmico por suas tentativas de discutir as possíveis relações entre religião, ciência e epistemologia. A sua tese mais popularmente conhecida talvez seja aquela na qual pretende lançar dúvidas sobre um darwinismo exclusivamente naturalista através de suas consequências filosóficas. 

De início, Plantinga admite que, sozinho, o darwinismo é inofensivo para as bases da fé cristã. Uma vez que sua formulação básica moderna diz somente que a evolução é um processo de mutação genética aleatória somada à seleção ambiental cumulativa não-aleatória, nada impede que aí haja intervenção divina.

Para ele, a aleatoriedade da mutação genética significa somente que ela não pode ser prevista, controlada ou mesmo orientada pelos meios científicos conhecidos. Nada impede, porém que Deus a esteja guiando como um designer para criar os seres vivos que vemos.

Entretanto, assevera Plantinga, o darwinismo moderno somado ao naturalismo metafísico está em franca oposição ao cristianismo. O naturalismo afirma que não há nenhuma espécie de ação divina no mundo. Ou seja, tudo não passa de processos naturais que se bastam a si mesmos e que não têm em sua origem ou em seu desenvolvimento e manutenção qualquer interferência divina. Assim, o homem e todos os seres vivos seriam o produto de um processo não-teleológico que visa somente à sobrevivência das espécies.

Michael Ruse, conhecido filósofo naturalista britânico, defende que essas sejam as bases da reflexão filosófica hodierna e que antigas questões filosóficas sejam respondidas a partir do que sabemos através da biologia. Em tom emblemático, ele assevera que é necessário “levar Darwin a sério” (Taking Darwin Seriously é o título de uma de suas obras).

Para Alvin Plantinga, contudo, “levar Darwin a sério” pode resultar em descobertas bem diferentes daquelas defendidas por Ruse. É o que ele pretende mostrar em um artigo onde apresenta o seu "argumento evolucionário contra o naturalismo". 

Se imaginarmos uma espécie qualquer de seres inteligentes que tenham suas faculdades cognitivas formadas ao longo de um processo evolutivo darwiniano não-guiado por ação divina, poderemos dizer com respeito às suas crenças que elas serão de alguma forma confiáveis? Tudo dependerá da relação entre crença e comportamento.

1) Se pensarmos como o epifenomenalismo, então as crenças em nada influirão no comportamento, sejam verdadeiras ou falsas; assim, a confiabilidade das crenças seria baixa;

2) O epifenomenalismo semântico afirma que as crenças têm papel causal no comportamento somente por sua estrutura sintática e não por sua semântica. A crença teria então um padrão de atividade neural, sua sintaxe. O conteúdo da crença, sua semântica (como verdade ou falsidade), porém, não influenciam causalmente o comportamento. De novo, a confiabilidade das crenças se mostra baixa.

3) Pode-se pensar que as crenças realmente influem causalmente no comportamento, mas são desfavoráveis, mal-adaptativas. Nesse caso, como nos anteriores, a confiabilidade seria baixa.

4) O quarto caso seria aquele em que as crenças influem no comportamento e são, em acréscimo, adaptativas. Neste caso, qual seria o nível de confiabilidade dessas crenças? Eis o cerne do problema. Para ele, Plantinga tem a mesma resposta das alternativas anteriores: a confiabilidade é baixa.

Por que essas crenças seriam tão pouco confiáveis? Pelo simples fato de que a adaptação não precisa necessariamente de crenças verdadeiras. Há uma infinidade de crenças que poderiam causar o mesmo comportamento adequado em uma dada situação. Como a de um hominídio que acreditasse que se afastar e fugir de um tigre era respeitar um preceito de alguma divindade segundo a qual aproximar-se de um tigre seria grande blasfêmia.

Nesse caso, o comportamento perfeitamente adaptativo seria causado por uma crença eminentemente falsa. E para mesma ação, para o mesmo comportamento, uma infinidade de crenças falsas poderiam produzi-la. Então, a par desses fatos, a probabilidade de que as crenças sejam confiáveis é baixa, talvez inescrutável.

Assim, o naturalismo encontra aí um defeater. Um defeater é uma razão para abandonar, duvidar de uma crença. Se eu sou um cartesiano extremado e creio que um gênio maligno deturpou todas as minhas faculdades impedindo-me de ter crenças verdadeiras, então tenho um defeater contra a confiabilidade de minhas faculdades cognitivas e serei obrigado a desconfiar delas.

De modo análogo, se o naturalista darwiniano crê que nossas faculdades cognitivas são o fruto não-guiado de um processo não-teleológico que visa somente à sobrevivência do ser vivo, então ele tem contra si mesmo um defeater, pois tudo o que sabe sobre o mundo, e mesmo suas teorias, ele hauriu a partir de suas faculdades cognitivas que, afinal, só se importam com a sobrevivência e não com a verdade. Como pode ele então sustentar a verdade de sua teoria se ela mesma afirma que nossas crenças, para serem adaptativas, não necessitam dar um conhecimento verdadeiro do mundo?

Por outro lado, segundo Plantinga, o teísta sabe que Deus criou o homem e suas faculdades cognitivas para conhecer a verdade, então não tem motivos para duvidar de sua confiabilidade e sua eficiência nas condições em que foram criadas para funcionar. Plantinga aponta aqui para o fato de que se não há designer, não há garantia de que o homem possa conhecer verdadeiramente.

A objeção mais natural ao argumento de Plantinga - e, de fato, a mais recorrente - é apontar para a conhecida falibilidade de nossas faculdades. A falibilidade já é amplamente conhecida, reconhecida e não implica que as faculdades sempre falham. Entretanto, primeiramente, Plantinga não parece estar querendo dizer algo novo acerca da falibilidade das faculdades, mas sim querendo apontar para um traço fundamental do combo darwinismo/naturalismo.

Sempre se reconheceu que o homem podia se enganar no processo do conhecimento. Isso é plenamente verdadeiro. Embora as faculdades possam reconhecidamente falhar, em nenhum momento isso significou que elas falham todo o tempo ou na maioria das vezes.

O que sempre se afirmou, pelo menos desde Aristóteles, é que havia a possibilidade da falha, do engano, em determinadas circunstâncias. Tais circunstâncias seriam aquelas nas quais um aparelho destinado a acertar se via em condições não aptas para seu uso. 

Dito de outro modo, em ocasiões não apropriadas, o aparelho cognitivo forneceria respostas errôneas. Mas essas respostas errôneas poderiam ser corrigidas à luz de novas respostas alcançadas dentro das condições normais para o funcionamento dos meios de conhecimento. Por conseguinte, a confiabilidade destes estava garantida desde que se conhecessem as condições ideais de seu uso.

Para Plantinga, a novidade do darwinismo/naturalismo não é afirmar que a evolução natural, como um gênio maligno, produziu nossas faculdades cognitivas para sempre fornecer respostas errôneas, pois neste caso o darwinismo seria um caso claro de auto-refutação. A novidade, ainda segundo Plantinga, vem do fato de se afirmar que as faculdades cognitivas têm a tendência fundamental de fornecer somente um retrato útil do mundo. Ou seja, em tese, elas têm a tendência de dar respostas falsas se isso for necessário para a sobrevivência do ser vivo.

Aqui não se trata mais de faculdades que falham em circunstâncias bem determinadas, mantendo sua confiabilidade geral, mas de faculdades que darão respostas falsas se isso beneficiar a sobrevivência. Essa é uma racionalidade cuja astúcia está em mentir se isso for necessário. E determinar qual o alcance dessas crenças falsas (boas para a sobrevivência, no entanto) é impossível, pois todo nosso aparelho cognitivo está envolvido nisso. A possibilidade vai desde uma ou poucas crenças até a totalidade delas.

Eis porque Plantinga defende que o naturalismo/darwinismo é eminentemente self-defeating. Muitos naturalistas defendem abertamente que algumas dessas crenças falsas com vantagem adaptativa podem ser conhecidas e apontam para certos costumes, para certos padrões de moralidade e, sobretudo, para as crenças religiosas. Estas seriam um exemplo clássico. São falsas, mas têm sua origem em sua vantagem adaptativa.

A questão é: "Por que a ciência deveria ser de uma constituição diferente das outras atividades humanas?" Ou seja, por qual razão a ciência não poderia estar entre essas crenças falsas, porém vantajosas do ponto de vista da mera adaptabilidade e sobrevivência?

O que Plantinga faz em seu argumento é voltar a carga contra os naturalistas e levar até eles algumas conseqüências não-pretendidas de seus próprios argumentos. E aí existem importantes problemas conceituais a serem resolvidos.

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Carta a William Graham, Down, July 3rd, 1881. In The Life and Letters of Charles Darwin Including an Autobiographical Chapter, ed. Francis Darwin (London: John Murray, Albermarle Street, 1887), Volume 1, pp. 315-316.

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Leia também:

Artigo completo de Plantinga:



8 comentários:

Anônimo disse...

Reconheço uma certa força do argumento, mas surge um problema: a verdade pode ser verificada a posteriori. No exemplo do sapo que come moscas (pq moscas são alimentos), e do sapo que igualmente come mosca (mas pensa que se transformará num príncipe), o último corrige sua crença pq nenhuma sapo que comeu moscas se transformou em príncipe.

R. Oleniski disse...

Olá!

O problema é mais complexo do que isso. A suposição de que a verdade pode ser verificada a posteriori não resolve o problema, mas supõe como resolvido justamente aquilo que está em questão.

A verificação a posteriori da verdade só seria possível se as faculdades cognitivas fossem plenamente confiáveis, o que é justamente o que está em questão. A própria idéia de verificação pressupõe faculdades orientadas à verdade e o que o argumento mostra é que o darwinismo/naturalismo não pode garantir essa condição.

Como o argumento não afirma que da perspectiva darwinista/naturalista infere-se necessariamente que todo conhecimento é falso (somente que é possível deduzir a dúvida de que as faculdades cognitivas estejam ordenadas à verdade), é possível que haja casos em que a verificação a posteriori seja real. Mas ainda assim, isso não resolve o problema, já que a mera adaptação não exige faculdades ordenadas à verdade, somente ao que é útil à sobrevivência.

"Para Plantinga, a novidade do darwinismo/naturalismo não é afirmar que a evolução natural, como um gênio maligno, produziu nossas faculdades cognitivas para sempre fornecer respostas errôneas, pois neste caso o darwinismo seria um caso claro de auto-refutação. A novidade, ainda segundo Plantinga, vem do fato de se afirmar que as faculdades cognitivas têm a tendência fundamental de fornecer somente um retrato útil do mundo. Ou seja, em tese, elas têm a tendência de dar respostas falsas se isso for necessário para a sobrevivência do ser vivo."

Por essa razão, nunca estaremos certos de que aquilo que conhecemos é verdadeiro (ainda que em muitos casos possa sê-lo), já que o objetivo central das faculdades cognitivas não será a verdade e sim a mera sobrevivência do indivíduo. E a sobrevivência pode em muitos contextos ser mais facilmente alcançada com a ilusão do que com a verdade.




José Adairtes disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
R. Oleniski disse...

Olá José.

Eu não li a crítica, mas se ela se reduz a dizer que o Plantinga não conhece Biologia e Estatística, não parece ter lá muita importância.

Primeiro, é muito comum que refutações desse tipo sejam, no fundo, exemplos de falácia genética. "Fulano não sabe o que diz porque não tem a formação na área X". Isso pode ou não ser relevante, dependendo de como o autor usa suas informações, a importância dessas remissões a áreas que ele não conhece profundamente dentro do argumento, etc.

Não é tão fácil, à primeira vista, refutar alguém simplesmente dizendo que possui a formação necessária. Há casos perfeitamente aceitáveis nos quais o autor não tem formação específica e, no entanto, conhece o suficiente da área para discuti-la.

Segundo, é preciso distinguir qual o nível do discurso em que o autor se coloca. No caso do Plantinga, ele não está discutindo nenhum problema ou questão específica seja da Biologia, seja da Estatística. Ele não está discutindo o papel de órgãos vestigiais nos organismos ou como se formaram as asinhas da borboleta. Essas são questões específicas da Biologia como ciência particular.

O mesmo serve para a Estatísitca. Plantinga não está discutindo a distribuição estatística de pobres em uma nação, por exemplo. Essa é uma questão específica da Estatísitica.

Plantinga está discutindo, isso sim, as implicações filosóficas de teorias da Biologia e da Estatística. Isso é algo completamente diferente de discutir temas próprios dessas ciências.

A questão não é se a evolução aconteceu ou quais são as evidências para ela, etc, algo cuja matéria pertence ao biólogo. A questão é se, tomando hipoteticamente a evolução como verdadeira, tendo em vista que a adaptação pode muito bem privilegiar a formação de faculdades cognitivas que não conduzem a informações verdadeiras, mas que, não obstante, são perfeitamente adaptadas, qual o grau de confiabilidade teórica dessas mesmas faculdades?

Essa é uma questão filosófica. É claro que ela exige algum conhecimento de Biologia, mas ela não depende de uma formação em Biologia. Ela sustenta-se por si mesma por ser uma dúvida que nasce como consequência lógica da afirmação de certas teses.

Esse tipo de questão não é solucionada por um conhecimento maior ou menor de Biologia. Ela pode inclusive ser formulada fora de qualquer referência à Biologia: "são confiáveis as faculdades cognitivas de um ente cuja formação dessas mesmas faculdades não obedeceu a um desígnio explícito de formar faculdades dirigidas à verdade?".

Formulada assim, o caso darwiniano é só um caso possível entre outros nos quais essa é uma questão legítima. Por exemplo, alguém que dissesse que nossas faculdades cognitivas nasceram do puro acaso também estaria obrigado a responder a questão supracitada. Outro exemplo é o célebre demônio cartesiano.

O ponto fulcral não é biológico, mas filosófico. Se admitimos que a formação de nossas faculdades cognitivas pode ter como objetivo a mera adaptação e não a verdade, que confiabilidade essas faculdades podem exibir?

Note-se que a questão é menos ainda de Estatística. Não é determinar estatisticamente quais são nossas crenças verdadeiras e quais são falsas, mas sim entender que, uma vez que nossas faculdades cognitivas não foram formadas explicitamente para a verdade, mas somente para a adaptação, todas as nossas crenças tornam-se, ipso facto, suspeitas.

Não que todas elas sejam falsas, nem que todas sejam verdadeiras. O ponto não é esse. O ponto é que elas tornam-se todas suspeitas. Todas ficam sob suspeita justamente porque não há como sair de nossas próprias faculdades e ver as coisas como elas são realmente.

Sendo assim, não é uma questão biológica ou estatística que Plantinga propõe no seu argumento. É uma questão de princípio. Boa parte das críticas erra nisso por simplesmente ignorar do que afinal Plantinga está falando.

Enfim, não li a crítica, provavelmente não leria, mas baseado no que você disse, acho que esses comentários esclarecem o ponto.

Abraços!

José Adairtes disse...

Bom Rogério, não sei se ajuda, mas a confiança em nossas faculdades cognitivas é contestada pela neurociência cognitiva (muito naturalista ela). Uma simples ilusão óptica é um ataque às faculdades cognitivas. A busca de nosso cérebro por coerência é uma ameaça às convicções da mente humana. Boa parte do trabalho dos cognitivistas é entender como ocorre o processamento da informação, como (por exemplo) os vieses de todos os tipos interferem em "nossas faculdades cognitivas". Não há problema em lidar com isso. É um estudo bem naturalista. Os trabalhos do Kahneman nessa área são bem legais.

R. Oleniski disse...

Olá, José!

A questão é mais complexa. O argumento do Plantinga não é simplesmente uma afirmação dos defeitos ou da imperfeição das faculdades cognitivas em determinados casos ou situações. A tese de Plantinga é a de que o combo naturalismo/darwinismo enseja uma visão das faculdades que, sendo correta, põe sob suspeita qualquer tipo de informação proveniente dessas faculdades.

É óbvio que Plantinga sabe que há momentos ou situações de ilusões ou de mal-funcionamento das faculdades. Ele fala extensamente sobre esses casos no seu "Warrant and Proper Function". Aliás, a noção de "proper function" supõe exatamente isso que a neurociência trata, a saber, que, em certas situações, as faculdades cognitivas sofrem um decréscimo de sua confiabilidade.

Para ir mais longe ainda, Aristóteles já dizia que as informações dos sentidos, por exemplo, podem ser afetadas por fatores externos a seu funcionamento normal. Tudo isso é bem conhecido.

Agora, por outro lado, e faço aqui uma pequena digressão, há que se estabelecer bem o que significam essas "ilusões ópticas". Veja que há uma diferença imensa entre a informação sensitiva em determinadas condições e o julgamento dessa informação. No caso clássico da vara imersa na água, por exemplo, os sentidos nos enganam vendo-a quebrada quando ela é reta ou eles deram a informação correta de como a vara aparece dentro daquelas condições específicas?

Se eu julgo que vara é quebrada, isso é algo que vai para além da informação dos sentidos. A visão me mostra como a coisa aparece naquela situação concreta e eu julgo sua realidade a despeito de todas as situações. São duas operações diferentes.

Ademais, o que seria a informação correta nesse caso da vara? Que ela aparecesse reta, "como ela é na realidade" ou quebrada, como ela deve aparecer dentro das condições concretas em que se encontra? No primeiro caso estariam ausentes a informação da imersão da vara em um meio mais denso e as consequentes mudanças no aparecimento da mesma sob estas condições. Qual das duas é a informação correta?

Voltando ao caso do Plantinga, algumas coisas devem ser vistas. Primeiro, a coerência interna dessas teorias neurocientíficas. Se elas vão longe demais no seu questionamento da confiabilidade das faculdades cognitivas, elas põem-se elas mesmas em xeque. E isso por razões óbvias.

Contudo, para identificar ilusões, é necessário saber quando não estamos nos iludindo, ou seja, quando temos real conhecimento do que se passa. Ora, na medida mesma em que essas teorias neurocientíficas identificam ilusões, elas afirmam os casos onde essas distorções não se dão como os casos-padrão. As ilusões não podem ser o padrão, caso contrário nem mesmo essas teorias poderiam se sustentar.

Esse é o ponto do Plantinga e a segunda coisa a se considerar. O que Plantinga diz é que se o darwinismo/naturalismo estiver certo, nenhuma informação cognitiva será confiável, ainda que nem sempre seja falsa. O problema é perdemos todo o critério, pois mesmo nos casos-padrão que assumimos como verdadeiros, não saberemos se eles de fato são assim.

Os críticos de Plantinga raramente atentam para a profundidade dessa tese. Não é uma ciência particular como a neurociência que pode abalar nossa fé na confiabilidade das faculdades cognitivas, pois ela mesma depende dessa confiabilidade para se afirmar a si própria. É o conjunto do darwinismo/naturalismo que coloca tudo em questão.

Estando Plantinga certo, nenhuma informação neurocientífica será confiável, não importando o grau de profundidade das pesquisas justamente porque as fontes últimas do conhecimento - nossas faculdades - estão sob suspeita. O neurocientista estuda nossas faculdades cognitivas utilizando suas faculdades cognitivas. Ele não pode pôr-se fora delas, despir-se delas, pô-las entre parênteses e continuar suas pesquisas.

R. Oleniski disse...

Continuação:

Toda ciência se funda em conhecimentos não-científicos que são muito mais diretos e muito mais confiáveis do que aquilo que a própria ciência alcança em seus resultados. O cientista tem que confiar nos seus sentidos, na sua memória, na realidade externa, na existência de outras mentes, na indução, etc, para que sua ciência seja possível e os resultados confiáveis.

Consequentemente, se suas faculdades estão sob suspeita, que confiabilidade terão quaisquer resultados a que ele chegue ao final de suas pesquisas? Esse é o ponto central do argumento de Plantinga: se o combo darwinismo/naturalismo estiver certo, não haverá confiabilidade.

O argumento de Plantinga não pode ser dirimido por remissões à neurociência ou a qualquer ciência justamente porque todas elas dependem da confiabilidade das faculdades cognitivas. Tentar solucionar o problema com teorias científicas é um erro categorial clássico. O problema de Plantinga é metafísico, ou seja, trata das próprias condições do conhecimento e não depende de quaisquer resultados científicos.

Espero ter ajudado!

Abraços!

P.S.:desculpe pela demora na resposta.

José Adairtes disse...
Este comentário foi removido pelo autor.